Você deseja mesmo a liberdade?
“Como é possível encontrar amarras que nos libertem?”
–Contardo Calligaris
O blog Bravus.net indicou o vídeo acima, uma adaptação de Christian Caselli para uma HQ de Wolinski. O Rodrigo fez alguns comentários focando a posição do homem que aprisiona o pássaro. Ao final, ele cita o Não2Não1.
É claro que concordo com essa abordagem. Sim, nós prendemos o outro com nosso olhar, com gestos, com restrições sutis, com nossa simples presença. Criticar esse processo já virou até lugar-comum. No entanto, eu gostaria de fazer uma provocação. E se, em vez de nos identificarmos com o homem que prende, nos identificássemos com o pássaro da metáfora?
Em meu primeiro ano de Filosofia, sob a orientação de Olgária Matos, estudei uma curiosa obra do francês Étienne de La Boétie: Discurso da Servidão Voluntária (séc. XVI). O título evidencia a problemática, ou seja, por que um ser livre se sujeitaria à servidão? São várias e tortuosas as análises possíveis. Uma das conclusões é a de não é o tirano que cria uma sociedade tirânica; pelo contrário, é a sociedade tirânica (na qual os homens desejam a servidão) que produz o tirano. Ou, nas palavras de Marilena Chauí, “nem coragem e força do tirano, nem covardia e falta de fibra dos tiranizados engendram a servidão voluntária, mas apenas o esquecimento da liberdade”.
O que me interessa agora é a noção de liberdade como sendo natural e sua continuação na idéia de que se realmente desejássemos a liberdade, já a teríamos. Desejar algo que já possuímos é obter satisfação imediata. O próprio La Boétie afirmou: “Decida não mais servir e será livre”. Por que então nos sujeitamos a aprisionamentos e restrições dos outros? Afinal, se estamos presos é porque estamos desejando algo que não a liberdade, estamos sustentando um desejo de servir.
Para que isso aconteça, é necessário que eu esqueça de minha liberdade original e passe a procurá-la no outro. O mesmo se dá com a autonomia, pois o outro nunca de fato chega a possuir o poder que eu lhe concedo sobre mim. Ainda assim, a pergunta continua: “Mas por que eu faria isso?”. Uma possível explicação é a existência de um pacto de mediocridade, uma troca de garantias. Eu abdico de minha liberdade e autonomia se você igualmente renunciar. Eu sirvo e obedeço se você também o fizer. Para não perder o outro, eu o aprisiono. Antes, porém, para aprisioná-lo, eu me deixo aprisionar. Obedecemos porque queremos dominar.
Tal lógica chega a ser absurda, mas não menos verdadeira. Nosso desejo por liberdade e nossa servidão voluntária são dois motores do mesmo processo, criado pelo esquecimento de nossa liberdade e autonomia naturais. Sobre isso, no fim do curso, após a entrega de uma extensa análise, perguntei a Olgária: “Sem cair em argumentações, em poucos segundos, me responda por que não desejamos a verdadeira liberdade, por que escolhemos esquecer?”. Ela não hesitou e explicou que a liberdade é a total falta de segurança, ausência de chão, vazio de certezas. É espaço criativo, sem definição, encruzilhada, abismo. Tudo o que não queremos na vida e, principalmente, em nossos relacionamentos.
Falamos tanto em liberdade, quando o que mais desejamos é um “Eu te amo” que dure para sempre, um colo que não nos abandone, uma casa que nos acolha por inteiro. Sim, sentimos prazer e conforto ao sermos aprisionados. Tanto que, quando o outro nos solta, sentimos que algo está errado, que ele não gosta mais de nós. Queremos que ele sinta apego e carência por nós. Queremos surtos de ciúme para comprovar seu amor. Somos o pássaro e não saberíamos o que fazer se alguém nos abrisse a gaveta.
Em troca, oferecemos nossa promessa de amor eterno, um colo, uma casa. Em nossa gaveta, sentimos o mesmo prazer ao aprisionar. E quando soltamos, é por falta de tesão, cansaço da relação, desatenção – nunca por desejar a liberdade do outro, afinal dependemos dela para usufruirmos da nossa, eis o pacto. Com conforto e segurança, sentimos que enfim encontramos a liberdade e autonomia buscadas. Podemos então nos dedicar a congressos de psicanálise e teses sobre Nietzsche, como o homem da animação.
Mais do que aquele que aprisiona, somos o pássaro engavetado. O outro me fixa? OK, pelo menos ele me diz quem sou. O outro me prende? Tudo bem, assim garanto que não o perderei. O outro me restringe? É melhor assim, já sofri muito quando passei de meus limites. O outro me fecha? Ótimo, pois preciso me sentir seguro.
Se ainda tem dúvidas quanto ao prazer do aprisionamento, analise a dinâmica do início de qualquer relacionamento amoroso. O que é a paixão senão envolvimento? Quanto tesão sentimos ao fisgar o outro ou sermos encurralados? Contamos com alegria e orgulho aos outros: “Estou 100% envolvida!”. Ou: “Eu a peguei de jeito dessa vez!”. Parece que a metáfora da gaveta não é tão distorcida assim…
Finalmente, a provocação. Você deseja mesmo a liberdade? Haverá alguma espécie de paixão ou envolvimento que não se dê por aprisionamento? De que seriam feitos os tais laços que libertam?
Depois de ler este post, não sei se desejo a liberdade. Gosto desta segurança que o aprisionamento proporciona. Nunca havia pensado desta forma. Achei excelente, maravilhoso!
E não consigo imaginar uma relação livre! Não mesmo.
Talvez entre amigos de muiiittos anos, que se sentem amigos e amam, mesmo sem nada do outro, nenhuma segurança, a não ser o amor mesmo. Esta talvez..
Agora entre homem e mulher, não acredito que estamos preparados pra este desprendimento não.
😉
De todos os textos que já li aqui no blog, sinto que esse foi o que melhor traduziu minha maneira de pensar … infelizmente (ou nao) essa minha visao de “liberdade” nao combina com a maneira DELA de enxergar as coisas, e por isso as vezes é preciso forjar um ciúmes bobo, ou “aprisiona-la” para que ela se sinta bem. Será que faco errado em ser assim ? Mesmo com essas diferencas nos damos muito bem, e me sinto feliz com ela.
Desejar relacionar-se com o outro, já é uma privação voluntária da sua liberdade.
Desejar depositar a responsabilidade de sua felicidade, esperança, anseios em um terceiro.
Buscamos certezas, essas que talvez nem existam, mas nos sentimos seguros assim, por pensar que a vida vai ser de um jeito, quando na verdade pode ser e vai ser completamente diferente.
Certeza é ilusão.
Ainda mais quando envolve outros.
E se pensarmos assim não queremos essa tal liberdade, que não nos dá certeza alguma.
Excelente texto.
Eu ia iniciar dizendo que foi seu melhor texto, mas tem tantos outros excepcionais que não me atrevo a julgar um deles como o melhor. É, sem dúvida, um dos melhores que já li.
No fundo, não quero a liberdade. Mas alguma barreira em mim me impede de me aprisionar. Estava conversando com um amigo sobre isso. Temos barreiras que nos protegem dessa prisão, e da dor e do sofrimento que a liberdade pós-prisão pode causar.
parabéns, sua abordagem sobre o tema foi perfeita.
du caral** o texto hauhua
ser preso para ser livre…
mas o problema é que sempre o passaro vai querer sair da gaiola, nem que seja para se arrepender e voltar como se nada tivesse acontecido, na maior cara de pau…
essa dualidade de pensamentos que estressa o ser humano, desejar preto quando se tem branco, querer 2 quando se tem 1, e etc etc etc…
Vejo com desconforto o modo como pensamos a liberdade, feito um substantivo abstrato, um conceito absoluto. Mas a liberdade somente É em relação à alguma coisa. Nesse sentido, daixar-se prender pode ser encarado como liberdade (ou não, evidentemente).
Né?
“daixar-se prender pode ser encarado como liberdade”
aeeeeeeeeeee!!!!
Thaise, é exatamente esse o grande lance.
Liberdade não é nada abstrata, mas essa capacidade de nos movermos, a qualquer momento, em qualquer direção, inclusive rumo a um puta envolvimento. Essa liberação de qualquer postura rígida, essa abertura.
O envolvimento como exercício da liberdade é A CHAVE. Mergulhar de olhos abertos em tudo o que nos aparece. E
E isso é tema de alguns posts que já escrevi e outros rascunhados. Fiquei muito feliz em ver essa idéia em um comment seu aqui.
Nesse post acima, eu critico uma abordagem que de fato existe, é uma armadilha na qual caímos e nos debatemos. Queremos uma liberdade livre de qualquer restrição, mas amamos restrições várias pois elas geram segurança. Isso gera um conflito e uma insatisação constante.
Precisamos chegar no ponto de desejar um outro tipo de liberdade, que não se oponha a nada, que não se oponha sequer à prisão que o outro possa (ou não) nos colocar.
Abração e obrigado!!!
Eu gosto da minha liberdade, gosto de ficar sozinha. O fato de ficar com alguém que “prenda” é confortável, mas quando termina, dá a sensação de vazio. Antes ter uma liberdade assistida pelo outro do que uma gaiolinha. O pacto é real, as abdicações são reais, mas acho que a palavra “prender” pelo “comodismo de ter” é forte demais.
Beijo
Eu sou mais livre quando estou namorando.
Solteiro, sou escravo de meus impulsos e iludo mais facilmente parceiras temporárias, o que é uma forma de auto-engano também.
Quando de fato estou envolvido, minha liberdade é potencializada pois tenho de ir além de minha rigidez, meus impulsos e desejos: tenho de olhar pelo outro.
Abraço!
É.
Ótimo pensar neste aspecto, a liberdade de querer estar preso. Como julgar que a pessoa não é livre?!?!
Belo ponto mesmo.
É o mesmo aspecto do amor, como não considerar Eros amor, só a Philia ou o Ágape.. Tudo é amor, cada um ama do seu jeito.
Cada um é livre do seu jeito, ama do seu jeito.. Escolhe sua vida, e, ainda bem, não existem nem certos nem errados..
Afinal, louco é quem me diz que não é feliz!
😉
Quanto ao aspecto de liberdade no namoro, muitos questionam que é bom ser “livre” e não ter compromisso, mas seu eu aprecio mais a liberdade de ter um carinho do outro, ou de me preocupar em agradar meu parceiro, isso é liberdade também.
Quando estou solteira, fico presa em minhas vontades sem poder realizá-las. Pelo menos da forma que quero.
É um dos melhores textos que eu já li aqui no blog, com certeza. Talvez o que eu mais prestei atenção e o que eu consegui absorver mais informações.
Vejo que relacionamentos abertos não pregam a idéia de liberdade que os casais adeptos defendem. E aqui o conceito comum de liberdade foi posto de uma forma totalmente diferente e coerente, como eu nunca tinha visto antes…
Quero alguém do lado de fora pra comentar esses seus textos, Gustavo. E sabe… Acho que é um bom texto pra apresentar pra Ana no dia do parque, não acha?
Abraços
é claro, é sempre o outro quem nos define: nos limita – só q a gente tem q perceber q o olhar demarcador do outro, vamos pôr nesses termos, não tem q significar, d pronto, q tudo o mais é limitado. esse é um erro muito comum. não é e nem nunca vai ser.
adorei o texto, e não conhecia essa animação. hehehehe, falando do mundo acadêmico, dei risadas, muitas risadas aqui……. show! 😉
“por que um ser livre se sujeitaria à servidão?”
já ouvi vários marmanjos “pegadores” entregando os pontos e me dizendo coisas como “estou ficando cansado dessa vida. está na hora de me amarrar em alguém!” :-O
será que somos realmente tão livres assim?
algumas vezes entre relacionamentos, já senti uma certa angústia pensando como é ruim se sentir sozinho (“How I hate being alone”, como naquele vídeo que apareceu num post anterior “Tales of Mere Existence: How to Break Up”).
é como se pudéssemos ser prisioneiros de nós mesmos individualmente (dos nossos próprios vícios e inseguranças). e pra se sentir prisioneiro, não seria melhor pelo menos dividir a cela com alguém do que ficar na solitária?
o seu post foi excelente! só não fiquei surpreso pois já faz um tempo que venho seguindo o blog e a boa qualidade dos textos não é de hoje. 😀
Gitti, acabo de conhecer o site e curti muito seu texto. Mas não sei se acredito em liberdade e autonomia naturais. Acho que ser livre e autônomo é conquista. Acho que a liberdade e a autonomia derivam mais do animo interno do sujeito que de estar ou não acompanhado. É possivel sentir-se livre estando casado, quando somos capazes de negociar bem com o nosso parceiro e influir positivamente no nosso futuro. Também é possível estar aprisionado e solteiro, quando atrelamos a nossa felicidade àquilo que está fora de nós, aos desejos e às paixões platônicas. Então acho que ser livre se parece mais com desfrutar o melhor de um momento da vida, o presente e as possibilidades reais e deixar o imponderável para o segundo seguinte, conscientes de que não o controlamos. Que tal?
Amarilis, sim, perfeito! Liberdade não se define pela estrutura da relação (solteiro ou não), e sim por nosso tipo de vinculação, por nossa postura, por como a energia circula em nós, de modo autônomo ou não (com venho falando em alguns posts).
Nesse post, critiquei uma idéia contradição que existe em nosso imaginário e pela qual constantemente sofremos e nos debatemos.
Valeu pelo comment. To indo agora ver seu blog.
Abraço!
Quem sabe a liberdade e a prisão sejam faces da mesma moeda?
Ou um jogo de palavras?
Percepções que dependem de quem analisa, como analisa e de quando analisa.
Difícil conceber a idéia de um ser totalmente autônomo, um ser permanente e independente.
Liberdade não é nada sem a consciência do que se quer com ela. Logo, é por isso que este exercício humano chamado relacionamento é tão importante na vida das pessoas.
me acho muito nos teus textos cara!
e a provocação: Tu vai na festa do Pompéia?
Exelente texto. Exatamente oq preciso refletir, Vejo que precisamos ter um pé na segurança (num relacionamento ou sozinho mesmo) e o outro pé irmos explorando a liberdade, esse espaço do não-saber do desconhecido, que nos causa tanta agonia. afinal “liberdade é a total falta de segurança !!”
Só tomem cuidado qndo qlqr relacionamento te prive de crescer. Fora isso, é otimo estar “preso” ha alguem q ame.
Gitti Adorei seus textos , e logo estarei na cabana ,,,
Ser livre implica a possibilidade de, sim, praticar a “servidão voluntária”, o altruísmo, o amor, a paixão o bem-querer pelo outro antes de si mesmo (como no amor paternal).
Se me impedirem de entrar em uma casa em chamas para salvar meu filho, estarão cerceando minha liberdade.
Sim, quero ser livre, inclusive LIVRE para escolher as prisões que melhor me aprouverem a cada dado momento da vida. Se no momento seguinte a prisão amor não mais me aprouver, quero ser livre para escolher outra, ou nenhuma.
[…] post inspirado nesse texto do blog Não 1 Não […]
Eu tenho a tendência de querer evitar situações em que me sinto presa. No início de fevereiro decidi morar com o meu namorado e acabei entrando em crise. Seu texto explica bem os fatores que me fizeram parar de me sentir encurralada.
Cheguei aqui pelo seu post no twitter. Gostei tanto que até fiz um post sobre isso no meu blog hoje.
Olá, Gustavo
Não concordo com o seu conceito de liberdade. Acho muito relativo. Liberdade, no meu entendimento, é você com vc mesmo. Não depende do outro. Se vc está num relacionamento por ter medo de ficar sozinho, vença o medo que vc será livre. Quer esteja namorando ou não. Vença aquilo que te prende, e vc será livre.
A liberdade é plena em si só. Também nem daria para ela estar presa a algo, pq negaria o seu significado.
Uma coisa que se vê muito por aí é que as pessoas confundem liberdade com libertinagem. Agora pago minha contas, moro sozinha então sou livre. Posso fazer o que quiser, com quer quiser. Errado. Isso é libertinagem e nada tem a ver com liberdade.
No exemplo citado acima, quem está mais preso, o homem ou o pássaro? O homem está preso a ter algo preso à ele. Já o pássaro, apesar de viver preso na gaveta, é preso pela angústia de viver desta forma. Mas, vencido isso, ele pode ser livre, mesmo preso.
No caso do relacionamento, muitos não expõe sua opinião, com medo do que o parceiro irá pensar. Ou então, não são eles mesmos, com medo de desagradar o parceiro(a). Que tipo de relacionamento é esse? Será que não é por isso que temos tantos casos de divórcios? Justamente pq fingimos ser algo que não somos e, como não é possível fingir o tempo todo, aos poucos nossas máscaras vão caindo e vamos revelando quem realmente somos?
Será que vale a pena se abnegar tanto assim em nome da falsa segurança? Porque o outro pode querer mais e te deixar sozinho. E vc? Deixou de existir em nome de outra pessoa que agora não está nem aí para você.
Eu reparo muito no que está a minha volta e pude perceber que várias pessoas que tiveram/têm câncer, se abnegaram. Fingiram não ver os casos do outro, para não perder a segurança do que chamam de lar. Não seguiram seus rumos, porque acreditavam que tinham que seguir a vida de seus pais. Não estou condenando ninguém que faça isso, mas faça conscientemente. Tenha consciência do que está fazendo, e não faça por medo. Mas se sentir que o peso é grande demais, caia fora. É a sua vida que está em questão.
Também percebo que muitas pessoas têm medo de tomar uma atitude, porque acham que não vão aguentar as consequências. Acham que são mais fracas do que realmente são. Acredito que nunca virá algo que não podemos aguentar. Todas as experiências que passamos, é porque aguentamos. Por isso, não precisamos temer.
Bjs!
Pessoas, muito boas reflexões, acabo de conhecer o blog e gostei muito.
Mas quero trazer uma reflexão diferente…
Um pouco da maneira como penso.
Acho que estamos dando em voltas aceitando o que me parecem ser simplesmente razões para sofrer, “sofrer por que somos humanos e somos assim mesmo” ou algo do gênero.
Podemos imaginar como nossas relações podem ser fora de nossa cultura, de nosso modo de vida, nossa civilização?
Recomendo:
http://www.continuum-concept.org/
http://www.continuum-concept.org/cc_defined.html
Links sobre o livro e o conceito de uma psicóloga que parece ter encontrado uma das principais causas para nossas “inerentes” carências. Para nossa “inerente” necessidade de segurança. Tem a ver com o que vivemos ainda como bebês, e costumamos esquecer. (o conceito no segundo link está em inglês, mas é curto e simples)
Mas ela não completa o quadro, não como vejo…
Lembremos que o questionamento de La Boétie parte da percepção (e da vivência) do PRAZER DA LIBERDADE, que segundo ele não se compara ao CONFORTO da servidão. Sim, a Liberdade é a total falta de segurança – mas a vivência desta “falta de segurança” é tranformadora por si só. Por isso que se coloca que só aceitamos a ilusória segurança porque não chegamos a vivenciar O QUE É a falta dessa ilusão. Afinal, tudo que temos a perder é uma ilusão. (Ou várias…)
(Atenção, ainda não estou me referindo em liberdade e servidão em relação a relacionamentos entre apenas duas pessoas… refiro-me mais a grupos, ou ao relacionamento de um indivíduo com a sua vida como um todo, por enquanto)
Aceitar a liberdade – e a falta de segurança – é intensamente prazeirozo, um prazer vivo, saudável, forte, autoperpetuante. Somem as dúvidas do que é a vida, do porque estamos aqui, qual nosso papel, nossa justificativa, enfim. A vida basta em si.
Quanto às nossas formas de nos relacionar em casais modernos. Atentem que essa “invenção” -casais modernos em vidas modernas- é muito recente, perto dos modos de viver e de se relacionar com os quais nossos corpos se adaptaram ao longo dos milhões de anos em que estamos por aqui (como humanos, sim). Precisamos de grupos com os quais vivermos juntos, como animais verdadeiramente sociais que somos, não precisamos de “meu plano de vida” + “colegas de trabalho” + “namorad@s” + “família” + “psicólogo”(diversas pessoas-fragmentos).
Somos preparados, biológicamente, para viver em grupos pequenos, próximos, de grande contato, onde relacionamentos “amorosos” entre duas pessoas podem brotar de maneira saudável, espontaneamente e segundo regras e vontades muito distintas das que vemos no contexto atual.
(Quando falo sobre o que somos “biológicamente”… bom, penso primeiro em como as emoções, os sonhos, as ações, as formas do célebro funcionar, os desejos, os tiques-nervosos, a fala… tudo são coisas do corpo, deste corpo que geralmente mal se conhece, mal se entende, mal se ouve. Corpo que não surge apenas quando nascemos – nele trazemos heranças antiquíssimas, muito “sábias”, preparadas para muitas coisas, ainda que não para tudo. Corpo que muitas vezes ignoramos, sobre nossos “egos” ultraconstruídos pela sociedade moderna)
O grupo unido, que vive junto, resolve problemas junto, sobrevive junto, é conforto suficiente, embora eu não diria nada sobre segurança – se iludirão com formas de “segurança” apenas de acordo com o modo de vida com que venham a optar.
Lembrando que o comentado acima se aplica: o grupo será sobretudo “livre”, como discutimos, assim como cada indivíduo do grupo é também “livre”(sim!), como também foi discutido, inclusive para abandonar o grupo e para negar suas escolhas a qualquer momento.
(Sobre isso recomendo principalmente os livros de Daniel Quinn, se incitou alguma curiosidade, são boas leituras.)
coração preso espírito livre. já me conquistaram com esse clichê de nietzsche… e é exatamente assim.
Acredito que somos, ao mesmo tempo, homem e pássaro. Não é o outro que nos aprisiona, somos nós mesmos. Aquilo que achamos que somos – homem, inteligente, phd em alguma coisa, grande amante, filósofo da própria vida – é na verdade apenas a prisão daquilo que gostaríamos de ser – pássaros, livres, soltos, sem amarras sociais, sem expectativas, sem papéis. Um dia aprisionamos o pássaro com tanta veemência que ele deixa de existir. Ou se recria, com mais força, com mais intensidade, como cão barulhento, na tentativa de que o incômodo causado pela sua própria prisão lhe traga liberdade.
Hoje foi a primeira vez que entrei nesse blog, e certamente não será a última, Gustavo. Se suas palavras escritas são essas, imagino a magnitude de seus pensamentos.
Depois de tudo o que foi dito, concluo que o que precisamos -apesar de paradoxal-, é das duas “coisas”, das duas situações. Liberdade e servidão.
Isso acho que já sabia meio que intuitivamente.
Aliás, falando em intuição, nos livros que o Gitti recomenda tem Mulheres que correm com lobos. Perfeito. Só tem que saber ler, e depois digerir. Porque é paulda o livro!
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