Amores possíveis

por Gustavo Gitti 27 janeiro 2008 26 comentários

“The greatest thing / You’ll ever learn is / Just to love / and be loved in return”
Eden Ahbez, Nature Boy (ouça enquanto lê, na voz de Nat King Cole)

Learning To Love You More“Eu havia comprado e embrulhado aqueles dois livros para ela. No dia seguinte, encontrei outra. Garota com piercing no nariz, tatuagem na nuca, corpo leve, pernas frenéticas. Impossível me lembrar dela em apenas um quadro. Era filme a menina. Assistiu à palestra sob meus olhos. Assim que acabou, fui atrás. Qual seu nome? Carolina. É você mesmo, então. Mandaram entregar, toma. O que é isso? Dois livros, mas se não gostar passe adiante, dê para um estranho. Ela gostou e uma semana depois trocamos mais alguns presentes.”

“O nome dela eu nunca lembrava. A cada manhã de domingo, a mesma pergunta incômoda. Meu esquecimento nunca deixou existir o primeiro encontro. Na sala de meditação, ela sentava em silêncio e me ouvia falar sobre filosofias estranhas. Sem conhecer os dramas um do outro, conversávamos abertamente sobre a natureza das emoções, a qualidade onírica da realidade e outras coisas assim, desnecessárias. Naquele domingo, ao fim da prática, ela se aproximou. Onde você vai almoçar? Não, hoje pretendo não almoçar. Suspeitando da mentira, insistiu. Eu só quero ficar perto de você. Saímos em silêncio. Eu não tinha o que falar. Ela estava cansada de escutar. Sentamos, comemos, olhamos, bebemos. Tudo em silêncio. O espaço às vezes ficava confortável, silêncio de amor. Às vezes incomodava e se parecia com aqueles momentos antes do sexo. Ao fim, nos agradecemos timidamente e fomos para casa.”

“Peito sufocado, doendo. Não conseguia comer nem dormir. Para onde fugir? 3h51 da manhã: a cidade inteira dormia dentro da minha solidão. Eu me sentia abandonado, incapaz de construir qualquer outra relação. Estávamos eu e a Tori Amos na sala. Fechei os olhos e comecei a acariciar a parede. Com dedos, braços, com o peito todo. Pernas, cabelo, pés. A textura, os mínimos relevos. Superfície expandida, interior totalmente exteriorizado. A parede era minha. O carinho, o amor, a capacidade de arrepiar pelos e conduzir sensações em qualquer mulher. Estava tudo ainda em mim. A pele do mundo, alma do avesso. Naquela noite, eu tive todas as mulheres do mundo.”

“Ela não sabia dançar, não se sentia mulher e tempo era o que não havia para perder. Já no segundo email, deixou o convite. Invada meus mundos, sem pudor, invada meus mundos. Minha resposta foi um simples OK. Passamos a madrugada de sexta vendo 3 filmes na Paulista. Sábado foi salsa e domingo tango em casa. Não eram os passos, o sexo ou os elogios e carinhos. Não era nada do que eu fazia. Era ela mesma aprendendo a se dançar.”

P.S. 1: A foto acima é de Jimmy Tharpe, que seguiu a tarefa “Tire uma foto de estranhos segurandos as mãos”, proposta por Miranda July no seu Learning To Love You More. É um amor possível… vai saber no que isso deu? Antes do amor, somos todos estranhos.

P.S. 2: Sexta fui ver Amores Surdos no Sesc Av. Paulista. Fica em cartaz até 24/02. Vale a pena! Se for com sua mulher, planeje algo para depois: a peça é curta e não tem nada de romântica.

P.S. 3: Se você é músico, tem post novo meu no Takadime.com.

P.S. 4: Somente uma das histórias acima aconteceu por completo. As outras três foram quase… Inventei alguns detalhes não vividos. Amores possíveis de fato (nenhuma ficção). Quem acertar primeiro ganha um livro sobre relacionamentos (escolherei a dedo e mandarei entregar na sua casa). Sério, basta comentar abaixo. Por favor, justifique seu palpite, ok? Assim fica mais interessante.

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26 comentários »

  • Vanilda

    Poxa, escritos profundos.
    Ninguem consegue escrever tão bem, algo que não tenha sentido profundamente,como sempre: Surpreendente.
    Legal a dica do filme no Sesc, devido a correria do dia-a-dia, perdemos muitos eventos culturais maravilhosos, você poderia criar no blog algo como IMPERDÍVEL DA SEMANA….rs.

    Bjao.

  • Vanilda

    Ops….ai vai meu meu palpite 🙂

    “Peito sufocado, doendo. Não conseguia comer nem dormir. Para onde fugir? 3h51 da manhã: a cidade inteira dormia dentro da minha solidão…..”

    Essa me pareceu uma descrição sincera e plena, para mim a mais tocante e profunda. Nesse trecho, sinto algo extremamente sincero: A vontade de tocar tudo e todos de alguma maneira, e, distribuir esse amor que sufoca por não ter para onde ir.

    Quero o livro…hahaha

  • Ricardo Acosta

    “Eu havia comprado e embrulhado aqueles dois livros para ela…”

    Eis meu palpite.

    * Agora vc participando da Caban do Dr. Love seus textos aqui diminuirão a frequência?

    []s
    Teu blog ‘mata a pau’
    acosta

  • Lunna

    “Ela não sabia dançar, não se sentia mulher e tempo era o que não havia para perder…”

    Este é o meu palpite. Uma mulher entregue, querendoo ser conduzida…Me pareceu bem familiar esta estória ! Acho que é real.

    bjs

  • Ricardo Acosta

    “Eu havia comprado e embrulhado aqueles dois livros para ela… ”

    Ai vai meu palpite. Postei antes mas parece que não foi!
    Acertei?

    []s
    acosta

  • roger

    O nome dela eu nunca lembrava. A cada manhã de domingo, a mesma pergunta incômoda. Meu esquecimento nunca deixou existir o primeiro encontro.

    creio que seja está, as vezes o encontro, o primeiro
    olhar, é tão confuso, e tão mágico ao mesmo tempo,
    que não precisamos agir, só observar o conto que nós mesmo somos os personagens.

  • Roger

    O nome dela eu nunca lembrava. A cada manhã de domingo, a mesma pergunta incômoda. Meu esquecimento nunca deixou existir o primeiro encontro.

    creio que seja esta, pelo fascinio do primeiro momento, que as vezes é tão incrivel que se torna-mos telespectadores da cena, e só deixamos acontecer.

  • Alê

    “Peito sufocado, doendo. Não conseguia comer nem dormir. Para onde fugir? 3h51 da manhã: a cidade inteira dormia dentro da minha solidão.”

    Esse é meu palpite.Os outros 3 se tratam da mesma pessoa eu acho, com muita licença poética.

    bjs

  • myla

    Gu, um dos seus posts mais lindos d todos os tempos!!!!

  • Rafael

    A ultima história é a verdadeira. Essa história conta o que você fez sexta feira após a peça da Paulista (seu ps.3), já que a peça era curta e você tinha o resto da madrugada disponivel.

    Acertei?

  • Guilherme

    Antes de tudo, muito obrigado pela passada lá pelo meu blog e pelo comentário quase conselho =].

    **

    Sobre o post, todas as três histórias parecem verossímeis demais para serem inventadas mesmo que seja em um ponto apenas.

    Mas, essa passagem:

    “Saímos em silêncio. Eu não tinha o que falar. Ela estava cansada de escutar. Sentamos, comemos, olhamos, bebemos. Tudo em silêncio. O espaço às vezes ficava confortável, silêncio de amor.”

    Exemplifica muito bem o que acontece quando surge aquela fagulha de amor, quando todas as palavras do mundo não são capazes de exprimir o que os dois sentem.
    Muitas e muitas vezes eu fico ao lado dela e não consigo falar nada, só olho direto nos olhos dela, e todo mundo parece perder o sentido, e aquele silêncio ao lado dela é a melhor conversa que pode existir.
    Muitas vezes esse silêncio nos faz conhecer melhor uma pessoa do que um milhão e meio de palavras.

    Abraços.

  • Gustavo Gitti

    “o primeiro olhar, é tão confuso, e tão mágico ao mesmo tempo, que não precisamos agir, só observar o conto que nós mesmo somos os personagens.”

    Os homens estão virando poetas aqui ou é impressão minha???

  • rachel

    Adorei. Nem vou votar mais pq não tenho mais chance…. RS.
    Parabéns!!!! (eu acho q é a primeira, hehe)

  • Ella

    Palpite: a última história é a verdadeira. Justificativa: simplesmente porque gostaria que fosse. Rs.

  • Thiago

    “Ela não sabia dançar, não se sentia mulher e tempo era o que não havia para perder. Já no segundo email, deixou o convite. (…)”

    Essa é verdadeira.

    SOMOS POETAS!

  • Carol Sumie

    Acho que a terceira história é a verdadeira, seguindo sua postura transparente de compartilhar os seus sentimentos; este diz respeito a vc. Os outros envolvem mulheres com quem esteve ou não, com quem viveu ou não estes momentos, e aí está a abertura para a licença poética, para falar o que você pensou sobre o outro.
    E além do mais, a terceira história foi a imagem que ficou mais forte.

    Um beijo

  • Thiago

    P.S. 2: Sexta fui ver Amores Surdos no Sesc Av. PAULISTA. Fica em cartaz até 24/02. Se é com mulher, PLANEJE ALGO PRA DEPOIS

    “(…) Passamos a madrugada de sexta vendo 3 filmes na Paulista. Sábado foi salsa e domingo tango em casa. (…)”

    Dá a entender que na madrugada de SEXTA você assistiu três filmes… Sábado salsa e domingo tango…

    Portanto, parece ser a real.

    valeu.

    ei, criei um blog..

    http://espelhando.890m.com

    vejam se gostam. valeu.

  • Dani

    Já votaram em todas as alternativas e eu não tenho mais chance de ganhar mas mesmo assim, vou palpitar: acho que é a última. E por quê? Porque pra mim parece a “mais possível”.

  • Ju

    Nossa… estou simplesmente fascinada pelos seus textos, são claros, profundos, seguros.
    Parabéns! Você tem me feito refletir bastante sobre o que sou, o que posso ser e o que quero para mim.

    Beijão.

  • Ella

    Pelamordedeus! Quando é que vc vai anunciar qual a história verdadeira?

  • Sarah K

    Cheguei muito tarde, mas não importa …
    Acho que esse trecho: “Peito sufocado, doendo. Não conseguia comer nem dormir. Para onde fugir? 3h51 da manhã: a cidade inteira dormia dentro da minha solidão…..” é o que realmente aconteceu, foi o que mais me tocou qdo li, o que me parecu mais visceral.

    bjs
    😉

  • Gustavo Gitti

    Pessoal,

    Adorei fazer isso. Escrevi o texto primeiro e só na segunda edição inseri a promoção do livro (tanto que o primeiro comentário foi feito antes de eu inserir o último PS).

    As mulheres são mesmo muito intuitivas, isso é fato. A maioria escolheu a história que me é mais próxima, recente, real e forte: a da parede. Mas eu não cheguei a tocar a parede, então ela é uma das leves invenções.

    A primeira também ocorreu bem assim (com esse diálogo, nesse lugar), mas depois não nos encontramos mais. Só isso inventei, amor possível.

    O almoço imaginei, queria algo assim, mas não aconteceu.

    O terceiro foi muito real e recente, exceto pelo toque na parede, imaginado, como disse.

    O quarto foi totalmente real. 😉

    O livro será enviado para você, LUNNA, querida. Me envie seu endereço (meu gmail é gustavodrums). Me fale também qual é sua “música do momento”.

    Em tempo, o querido Ian Black me disse que escreveu um post no mesmo modelo desse, leiam:

    http://www.interney.net/blogs/enloucrescendo/2007/02/27/os_5_melhores_beijos_que_eu_nao_dei/

    Abração!

  • Dani

    Opa, acertei! Mas não levei… 😀

    A última me pareceu a mais possível porque eu também fui ao Noitão e eu também não sei dançar. 🙂

  • Lunna

    Ueba!!!!! Eu ganhei ! Eu ganhei !! Adorei a iniciativa do “concurso”. Que bom que dei sorte de ser a primeira a comentar a alternativa verdadeira ! Valeu Gu ! To te mandando meu endereço !

  • Ella

    Legal! Estava muito curiosa e acertei o palpite. rs

  • Vanilda

    Putz….dava pra ter usado a lógica e acertado de primeira, mais fazer o que se a alma é uma viajante?!!! rs..mas foi muito legal essa idéia, porque da pra conhecer um pouco mais de você e do perfil de cada um que está por aqui….Bjaum…

    Valeu.

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